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segunda-feira, 29 de abril de 2024

O Culto à Jurema Sagrada

 O Culto à Jurema Sagrada

A jurema é um culto afro-indígena que tem na bebida sagrada de mesmo nome e na fumaça “Xamânica” o que o povo-de-santo chama de “Ciência”, que cura os males do corpo e da alma. 

O termo “Jurema” implica numa ampla utilização em relação a diversos aspectos ligados à religião, tornando-se um símbolo. Pode ser utilizado para designar a árvore, a bebida sagrada, o culto em si; também é aplicado como sinônimo de ‘ciência’; para indicar o nome da ‘cidade’ de onde vêm as entidades mestras e para se referir à Cabocla, entidade indígena. 

Os devotos iniciados nos rituais do culto são chamados de “Juremeiros”, bem como as entidades que vêm para os trabalhos espirituais são considerados Mestres e Mestras (ou princesas, dependendo do culto). 

A árvore Jurema, típica do Nordeste Brasileiro, já era cultuada muitos séculos antes da chegada dos europeus ao Brasil, principalmente, pelos tupis (tanto os tabajaras quanto os potiguaras) e cariris (tapuias). Esses povos habitavam o litoral da Paraíba, Rio Grande do Norte e o Sertão de Pernambuco e já utilizavam a Jurema em seus rituais, que eram conduzidos por seus pajés, grandes conhecedores dos mistérios da natureza, do mundo espiritual e dos animais. Com a chegada dos africanos escravizados, houve uma interação e uma troca de conhecimentos entre esses dois povos, resultando em um sincretismo religioso entre as tradições indígenas e africanas, dando origem a práticas culturais espirituais únicas, incluindo o Culto da Jurema que, ao longo do tempo, foi se adaptando aos novos contextos culturais.

Existem dois tipos de árvores de Jurema: a preta (Mimosa hostilis ou Mimosa tenuiflora) e a branca (Mimosa ophthalmocentra). Estes dois tipos são usados tanto para o preparo da bebida sagrada, como também para banhos, remédios, defumações e com objetivos terapêuticos para curar os males físicos e da alma. Seu uso se insere numa ampla tradição indígena de consumo de plantas psicoativas. A jurema-preta, inclusive, já está sendo amplamente estudada na medicina popular e na pesquisa de fármacos, onde as cascas do caule são utilizadas no tratamento de diversas doenças e patologias, como queimaduras e inflamações externas e internas, devido às suas propriedades antimicrobianas.

Estudos realizados no México e no Brasil avaliaram as propriedades antimicrobianas da casca do caule da jurema-preta e descobriram que essa planta apresenta grande potencial para combater bactérias gram-positivas, gram-negativas e fungos dermatófitos (que degradam a queratina de tecidos como unha, pele e pêlos). Segundo a literatura, a planta também apresenta vários efeitos terapêuticos como ação antioxidante, anti-inflamatória, antiparasitária, antifúngica e cicatrizante. (Fonte: CUNHA, 2022. Artigo: Efeitos Terapêuticos e Fitoterápicos da Jurema-preta).



Jurema-preta plantada nas dependências da Tenda de Umbanda Caboclo Sete Flechas e Jurema - Bom Despacho/MG. 2023


Como sinônimo de ‘ciência’, o termo Jurema se refere a um conjunto de práticas e conhecimentos que levam à cura tanto em seu aspecto espiritual como medicinal. Neste sentido, “ciência” corresponde às folhas, sementes, raízes, entrecasca e tronco da Jurema, ou seja, todas as partes da árvore que são aproveitadas. Estes são concebidos como poderosos elementos da natureza e como conceito de ‘conhecimento’ na manipulação desses elementos e nas práticas que levam à cura propriamente.


"Os próprios juremeiros definem o Culto da Jurema mais como uma 'ciência', um domínio, do que como uma 'religião" (LUZURIAGA, 2001, Livro: Jurema e Cura)


Segundo a literatura, enquanto “Complexo Cultural”, o Culto da Jurema está presente em todos os estados do Nordeste em diversos formatos, desde o contexto rural aos centros urbanos de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe. No Nordeste, seu culto é popularmente conhecido como Catimbó, Toré, Macumba; no Norte, como Pajelança, e na Bahia como Candomblé de Caboclo. Em cada lugar ou região o culto toma sua forma específica, sendo a preservação da utilização da bebida Jurema e da fumaça enquanto elementos fundamentais aos rituais, um forte elo entre os diferentes cultos e suas diversas denominações e particularidades em cada cidade.


"A arma do Juremeiro é o cachimbo. Ele coloca a intenção na fumaça." (Mestre Mulambo, TUCSFJ, Outubro/2023)


A bibliografia existente sobre este culto não é tão extensa, especialmente se comparada à bibliografia existente sobre o culto aos Orixás. Contudo, podemos aprender mais sobre ele através dos conhecimentos ancestrais passados pelas entidades nos trabalhos espirituais realizados no próprio culto; em Terreiros de Umbanda, entre outros. O poder e o mistério que envolvem esta árvore sagrada ainda são grandes para a nossa compreensão.


"A ciência da Jurema é oculta (raiz). Mas para entender a raiz, antes é preciso entender o que está acima dela." (Caboclo Sete Flechas, TUCSFJ, Janeiro/2024)


Camila de Iemanjá

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