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quinta-feira, 22 de maio de 2025

Reflexões - Vivências no axé

 Reflexões - Vivências no axé

“Nada acontece ao homem, que não seja ele próprio”. E é parafraseando a excelentíssima professora Lúcia Helena Galvão, que inicio nosso estudo de hoje. 

Quando aceitamos o compromisso de nos firmarmos em uma casa de axé, vivenciamos um período de euforia que pode durar alguns meses. A sensação de descoberta e aprendizado nos preenche, e pode ser confundida com alegria, até porque, a euforia acompanha o interesse pelo novo. São nesses momentos que ela nos confunde, nos desfocando dos objetivos através de sensações e sentimentos. O tempo vai passando, a euforia se dissipa e o amor pela região vai aflorando mais e mais, bem como o senso de responsabilidade também. É nesse momento que nos tornamos umbandistas de verdade, para além do encanto, junto com consciência e maturidade.

Após esse primeiro momento, a espiritualidade vai se mostrando no seu âmago, fazendo-nos entender que o saber no toque do atabaque e no desenvolvimento mediúnico, são uma parte ínfima desse todo. Somos colocados cara a cara com nós mesmos, com a nossa essência que muitas vezes tentamos negar devido a padrões sociais e morais, mas no íntimo, apesar de nos reprimirmos, aquilo pulsa. Pulsa tanto que chega a incomodar, então vamos nos distraindo, e assim alimentando esse qualquer que seja. Todo esse processo é bem doloroso e questionador, muitas vezes não temos a sensibilidade de visualizar a beleza que é essa transformação, mas não podemos negar que, apesar dos pesares, é sim bonito de se viver.

No meio desses aprendizados, das giras em roda, de conversas, consultas e conexões com nossos ancestrais, nosso 'eu' é escancarado pra fora, de pouquinho em pouquinho, nossa escuridão nefasta é puxada pra luz, ai então tomamos ciência do que somos, e como encarnados mimados, começamos a procurar culpados pela nossa essência, pois aquilo que está exposto, não é algo que nos traz muito orgulho. Procuramos responsáveis por atitudes que tomamos, rezos que não fizemos, fofocas ditas e até pela vida vivida. Tudo é influência, responsabilidade de outro alguém, mas, se eu não posso dar nome aos meus próprios bois, que pessoa sou? Agora a sensação de irresponsabilidade começa a nos assolar. 

O estranho disso tudo é que aqui dentro desse terreiro, eu, Laura, nas minhas vivências, aprendi que todas as experiências que tive desde que nasci (até mesmo antes), foi porque eu as atraí, de qualquer forma que seja. Se eu as atraí, consequentemente eu sou a responsável pela minha vida. Assim, as rédeas dessa foram se ajeitando em minhas mãos, os monstros foram abraçados, aprendem todos os dias a conviver na penumbra. São sentidos, ouvidos e nunca renegados, às vezes as rédeas escapam e sinto o estrago que fazem, mas aí corro pra pegar elas de volta, acolhendo os pequenos indesejáveis.

Terceirizar a culpa no mundo faz parte do processo, mas quando isso é feito, ficamos impotentes diante a realidade, já que não temos o poder de mudar o outro, somente a nós mesmos. Ao alimentarmos esse sentimento e continuarmos na inércia, outra culpa vai nascendo e nessa eterna luta, como num clique, as ferramentas que a espiritualidade nos proporciona e nos ensina, passam a fazer sentido; elas abrem a fechadura e nossa mente vai se expandindo, o conhecimento sendo colocado em prática, o universo se desdobrando e, como disse um dia Epíteto: “A extinção da culpa marca o início do progresso moral”.

A culpa se esvai, e o sentimento de responsabilidade toma conta. Isso é autoconhecimento, autocuidado, autoamor e desenvolvimento pessoal. Cuidar da mente, corpo e espírito é o que faz a gente viver o axé. Seria estranho eu dizer que isso é parte do desenvolvimento mediúnico? Porque é assim que é.

Saravá meus ancestrais.

Laura de LogunEdé


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