Bebida e fumo na Umbanda: Entendendo o significado espiritual
A Umbanda é uma religião rica em simbolismos, saberes ancestrais e práticas espirituais que unem diferentes tradições. Dentro desse universo, certos elementos como o fumo e a bebida alcoólica despertam dúvidas, curiosidade e, muitas vezes, preconceito. Para compreender o uso desses elementos na Umbanda, é necessário ir além do olhar superficial e mergulhar no sentido espiritual que essas práticas carregam.
Em primeiro lugar, é importante desfazer um equívoco comum: o uso de bebida e fumo na Umbanda não tem relação com vício ou prazer mundano. Não se trata de um uso recreativo, desmedido ou irresponsável. Pelo contrário, essas substâncias são utilizadas de forma ritualística e consciente, como instrumentos que auxiliam no trabalho espiritual realizado pelas entidades que se manifestam nos terreiros.
Na Umbanda, os médiuns incorporam entidades que trazem suas próprias formas de se expressar, muitas vezes ligadas à sua vivência em outras encarnações ou à simbologia que carregam. Algumas dessas entidades — como os Pretos-Velhos, Caboclos, Boiadeiros e, especialmente, os Exus e Pombagiras fazem uso do fumo e, em certos casos, da bebida alcoólica como parte de seu trabalho espiritual.
O fumo, seja em forma de cigarro de palha, charuto ou cachimbo, é amplamente utilizado como uma ferramenta de limpeza energética. A fumaça atua como um veículo de purificação, ajudando a dissipar energias densas, cortar demandas negativas e harmonizar o campo vibracional dos consulentes e do próprio ambiente. Além disso, o ato de soprar fumaça é carregado de intenção e direcionamento energético. Entidades experientes utilizam o fumo como se fosse um “remédio espiritual”, com a fumaça sendo guiada para pontos específicos do corpo espiritual da pessoa, desbloqueando chakras e quebrando influências nocivas.
Já a bebida, especialmente o (aguardente), pode ter diversas funções dentro do ritual. Em algumas linhas, ela é oferecida como um elemento de “firmeza” da entidade — ou seja, um meio de ajudá-la a manter-se firme na matéria enquanto realiza seu trabalho. Em outras situações, a bebida é utilizada para higienizar instrumentos rituais, para “limpar” energias negativas ou como oferenda simbólica, representando alegria, celebração ou mesmo um contrato espiritual com forças da natureza. Não se trata de uma ingestão descontrolada ou que envolva o médium diretamente quem está utilizando aquele elemento é a entidade incorporada, com consciência e respeito ao espaço sagrado em que atua.
É essencial lembrar que as entidades da Umbanda são espíritos evoluídos, que atuam com amor, caridade e sabedoria. Mesmo Exus e Pombagiras muitas vezes mal compreendidos e associados indevidamente a forças “do mal” são trabalhadores da luz, que transitam nas zonas mais densas justamente para resgatar, equilibrar e orientar. Quando utilizam bebida ou fumo, fazem isso como parte de sua linguagem simbólica e energética, nunca de forma leviana ou irresponsável.
Nem todas as casas de Umbanda fazem uso desses elementos. Algumas seguem linhas mais próximas ao kardecismo e optam por rituais mais contidos, sem fumo ou bebida. Outras, mais ligadas às tradições afro-brasileiras ou indígenas, incorporam esses elementos com mais naturalidade. Essa diversidade não é um problema, pelo contrário, é uma das maiores riquezas da Umbanda. O importante é que cada terreiro siga sua doutrina com ética, respeito e coerência espiritual.
Para muitos que vêm de fora da religião, o uso de bebida e fumo pode parecer estranho ou até errado. Mas é justamente aí que entra o convite à compreensão. A Umbanda é uma religião de acolhimento, de amor ao próximo e de conexão com o sagrado. Julgar sem conhecer é perpetuar preconceitos e ignorar a profundidade de práticas que têm raízes ancestrais e propósito espiritual.
Quando vemos um Preto-Velho acendendo seu cachimbo, um Caboclo soprando fumaça sobre um consulente ou um Exu firmando sua presença com marafo, estamos diante de rituais que carregam séculos de sabedoria espiritual. Há ali um ato simbólico, um gesto de poder e cura, que vai muito além da forma física que assume. Assim como o Caboclo Sete flechas sempre nos ensina “A umbanda é séria para pessoas sérias”
Tauhane de Oxum
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