O Cruzeiro Mestre
O cruzeiro mestre é uma representação de todos os antigos mestres que foram enterrados em um local e, pelo ritual seguido da passagem, caracterizaram aquele solo sagrado para os adeptos que seguem e acreditam na ciência trazida e dominada por eles.
A partir do momento em que as grandes navegações promovidas pela Espanha chegam no “Novo Mundo”, trazendo consigo padres, missionários e congregações para colonizar e catequizar aqueles que se encontravam “perdidos” religiosamente na região, o catolicismo se encontrou com a Jurema, e deu-se sua influência no rito. Por causa dessa interseção, encontramos hoje, benzedores, rezadores e até mesmo as entidades do próprio culto, que carregam particularidades que remetem ao catolicismo popular, como o uso de terços, cruzes e imagens de santos católicos, por exemplo.
Um dos símbolos mais importantes para a igreja católica é o “castiçal de três bocas com as três velas acesas”. Há relatos que este foi trazido para o Brasil através de padres jesuítas, sendo utilizado em várias ocasiões. É interessante entrelaçarmos tal objeto com o culto da Jurema, já que com a influência da igreja católica, encontramos indícios da utilização deste símbolo naquela época e até os dias atuais dentro da ritualística do catimbó. Entende-se que o castiçal foi adaptado nos rituais, já depois da miscigenação, através justamente daqueles que ficaram e perpetuaram o conhecimento ancestral.
O castiçal na igreja católica possui um significado de fé do povo, além de contar com a utilização das velas, dando apoio para que ilumine a fé e a força trazidos pelos adeptos da religião, na Jurema Sagrada o significado é diferente.
Focado na representatividade dos três guardiões generais do culto, cada um desses tem a responsabilidade de guardar as chaves da grande ciência da Jurema Sagrada. Esses três estão diretamente ligados à força elementar da natureza, e com energias específicas ligadas ao carnal e ao espiritual, possuem a função de zelar pelos maiores segredos e ciências mantidas dentro do culto. Entende-se que todo o conhecimento adquirido através da Jurema, passa por eles.
Cada um dos guardiões possui um elemento e característica perante o cruzeiro, sendo o primeiro, com a vela centralizada na direita, representando as matas; o segundo é representado pela ciência, com a vela centralizada no meio; e o último, representando a alma, com a vela à esquerda.
Existe uma cantiga antiga que se refere ao cruzeiro mestre e os guardiões, vejamos:
“Pelejei tou pelejando como gavião no ar.... (2x)
São três velas acesas, são três castiçais,
três moças de branco,
e três Generais... (2)”
De maneira parecida, também é utilizado o terço e a reverência para santos, fazendo referência a influência católica, como São Sebastião e Santo Antônio, ou comumente falado como Santo Antônio Pequenino. O cruzeiro, também é utilizado em acomodações, e até mesmo nas mesas de consagração.
Existem relatos de antigos que participavam do culto da jurema, dizendo que: um juremeiro quando desencarnava, tinha uma semente de jurema plantada e o símbolo do Cruzeiro Mestre colocado em cima de seu túmulo pra identificar que ali teria um mestre aterrado. Bem como existem outros relatos do tipo, também dizendo que naquele local, juremeiros no plano físico faziam rituais, pois a terra se tornava sagrada para os adeptos.
Observando a pajelança indígena, onde estes tinham locais específicos para aterrar seus ancestrais, e mantinham a sacralidade da terra em respeito ao corpo e conhecimento dos que se foram pro outro plano, conseguimos ver claramente a influência dos povos originários, nessa ritualística do catimbó.
Entendendo historicamente o contexto do Cruzeiro Mestre no culto, conseguimos compreender a importância da sua liturgia nas antigas rodas de Jurema e, a necessidade deles no nosso presente. Encerramos nosso texto com um rezo cheio de conhecimento:
Corre Corre Cruzeiro Mestre
De azul e branco
Com as estrelinhas
Corre Corre Cruzeiro Mestre
De azul e branco
Com as estrelinhas
Vocês não sabem
Nem as conhecem
Elas vêm do reino de outro mundo
Vocês não sabem
Nem as conhecem
Elas vêm do reino de outro mundo
E há um rio lá
Eu vou mandar parar
Ela foi moça
Foi menina
Foi mulher de cabaré
Ela foi moça
Foi menina
Foi mulher de cabaré
Passa noite nas esquinas
Procurando quem lhe quer
Passa noite nas esquinas
Procurando quem lhe quer
E há um rio lá
Eu vou mandar parar
Salve a Jurema Sagrada, salve o Cruzeiro Mestre, saravá os Mestres!!!
Lívia de Obaluaê
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